segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Bicicletas: infraestrutura e respeito ainda pedalam devagar

Cansados de ficar parados no trânsito todos os dias para ir ao trabalho, moradores de Pinheiros cada vez mais adotam a bicicleta como meio de transporte e qualidade de vida. No entanto, pedalar pelas ruas e avenidas da cidade pode não ser uma experiência tão agradável, já que a civilidade ao volante por parte dos paulistanos evolui 'tão rápido' quanto à velocidade de sua frota de 7 milhões de veículos na hora do rush. Além da conscientização dos motoristas, também é essencial uma melhor infraestrutura para que as ‘magrelas’ possam integrar-se de fato ao cotidiano da metrópole.
O sucesso da Ciclofaixa de Lazer, com a implantação iniciada em 2009, demonstra o potencial que a cidade tem para receber projetos destinados ao uso de bicicletas. Todos os domingos, o circuito que liga os parques das Bicicletas, Ibirapuera, do Povo e Villa-Lobos tem intenso movimento. Já durante os demais dias da semana, não é raro notar ciclistas se aventurando nas principais avenidas da região.
“Vendo poucas bicicletas. A maior parte do trabalho aqui é manutenção, pois meus clientes passaram a utilizá-las mais como transporte”, afirma Carlos Roberto Dias Santos, que há 13 anos coordena uma bicicletaria em Pinheiros. Porém, ele próprio ainda não tem coragem de pedalar durante a semana. “Não venho de bicicleta. O trânsito deixa a gente inseguro, se tivesse mais ciclovias e ciclofaixas, mais pessoas usariam. Eu mesmo usaria”.
O jornalista Denis Burgierman mora em Pinheiros e utiliza a bicicleta como meio de transporte desde a adolescência. “Eu ia para a escola pedalando e hoje parece errado ver criança fazendo isso. Eu faço tudo de bike, não tenho carro". Apesar de identificar no bairro algumas ruas propícias aos ciclistas, ele confirma as dificuldades de se arriscar sobre as duas rodas. “Costumo andar pela Joaquim Antunes, pela Cônego Eugênio Leite, que ficam perto da minha casa. Mas, subir a Teodoro Sampaio é tenso e na Avenida Rebouças os ciclistas geralmente circulam na calçada, até porque os pedestres não gostam de caminhar lá por ser desagradável, com barulho e poluição".

Faria Lima
Obras da ciclovia na Faria Lima entre Rebouças e Cidade Jardim
Obras da ciclovia na Faria Lima entre Rebouças e Cidade Jardim

No que se refere às políticas públicas para viabilização das bicicletas como alternativa de mobilidade urbana, alguns projetos de ciclovias têm sido anunciados nos últimos anos, como, por exemplo, o da Avenida Brigadeiro Faria Lima. Desde abril, a
Ponto de ônibus sobre antiga ciclovia
Ponto de ônibus sobre antiga ciclovia

Subprefeitura de Pinheiros realiza as obras de um trajeto com 2,2 quilômetros de extensão no canteiro central da via, entre a Avenida Cidade Jardim e a Rua dos Pinheiros.
As obras do ramal no trecho entre as avenidas Rebouças e Cidade Jardim estão em fase final de implantação, com término previsto para o final deste mês. Quanto à continuidade do traçado até a Rua dos Pinheiros, próximo da Estação Faria Lima do Metrô, a regional não informou um prazo, pois depende do enterramento da fiação suspensa nos postes, procedimento que faz parte da reconversão urbana do Largo da Batata.
Porém, o trajeto original da ciclovia é mais amplo. Elaborado em 2010, o projeto completo integraria a Faria Lima às avenidas Doutor Gastão Vidigal e Hélio Pellegrino, que juntas somariam 9 quilômetros de extensão, da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) até as imediações do Morumbi Shopping. Este sistema ainda seria prolongado até a Avenida João Dias, totalizando 20 quilômetros.
“Infelizmente, a pista está sendo feita em partes e não inteira. A ideia é ótima, mas a execução é lenta, ao contrário dos investimentos feitos para o transporte motorizado individual. Esse projeto da Faria Lima tem mais de 20 anos”, afirma o diretor geral do Instituto CicloBR, Felipe Aragonez.
Antes do atual planejamento, em 1996 a Prefeitura de São Paulo implantou o primeiro trecho de uma ciclovia na Faria Lima, entre a Avenida Pedroso de Morais e a Rua Teodoro Sampaio. Com o início das obras da Linha 4 - Amarela do Metrô em 2005, alguns pontos finais de ônibus precisaram ser deslocados e o local escolhido para que fossem instalados foi justamente o canteiro central onde havia a pista para bikes. “Naquela época as ciclovias eram feitas para tirar as bicicletas das ruas e não atrapalhar os motoristas, não se pensava na segurança de quem pedalava”, diz o cicloativista Willian Cruz, que dirige a organização Vá de Bike e trabalha como analista de sistemas na Faria Lima.

Eliseu de Almeida

Apesar do circuito que compreende as avenidas Hélio Pellegrino, Faria Lima e Gastão Vidigal ainda estar no início do desenvolvimento, outros sequer saíram do papel. Ou melhor, dos papeis, como é o caso da ciclovia na Avenida Eliseu de Almeida, que já teve mais de dois projetos elaborados. O primeiro, de 2005, constava na Operação Urbana Vila Sônia. Já o segundo, foi anunciado pela Prefeitura em 2007 e consistia em 15 quilômetros de uma via exclusiva que interligaria a Cidade Universitária, o bairro do Jardim Colombo e o município de Taboão da Serra. As obras seriam concluídas em 2010.
Houve também o anúncio de uma terceira opção, esta elaborada por um instituto do exterior especializado em transportes, que encaminhou um projeto básico à administração paulistana. Porém, nenhum deles foi concretizado. “A Eliseu é um local comprovadamente prioritário pelo fluxo constante de ciclistas e pelos perigos a que eles estão expostos”, afirma o diretor administrativo da Ciclocidade (Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo), Gabriel Di Pierro.
Em abril, o pedreiro Lauro Neri foi atropelado na Avenida Pirajuçara, continuação da Eliseu, quando estava a caminho do trabalho. Aquela seria sua última viagem de bicicleta. O caso foi uma motivação a mais para que em maio, a Ciclocidade entregasse ao prefeito Gilberto Kassab uma manifesto com cerca de 5 mil assinaturas reivindicando uma ciclovia na Eliseu de Almeida. A iniciativa teve o apoio de moradores do Butantã, mas não houve retorno da administração. De acordo com levantamento da entidade, cerca de 500 ciclistas passam pela avenida diariamente.

Infraestrutura

Procurada pela reportagem, a Secretaria Municipal de Transportes (SMT) informou que “já superou a meta de implantar 100 quilômetros de infraestrutura cicloviária na cidade, que hoje conta com 54,4 quilômetros de ciclovias, 67 quilômetros de ciclofaixa de lazer, 3,3 quilômetros de ciclofaixa definitiva em Moema e 58 quilômetros de ciclorrotas, somando no total, 182,7 quilômetros”.
Protesto contra falta de ciclovia na Eliseu, em 2010
Protesto contra falta de ciclovia na Eliseu, em 2010

Sobre a situação dos projetos relatados, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), responsável pelos estudos técnicos dos circuitos, afirma que a ciclovia ao longo do corredor Faria Lima, entre a Avenida Engenheiro Luis Carlos Berrini e a Ceagesp, teve o planejamento iniciado pela SPUrbanismo.
Já o caso da Eliseu de Almeida, o projeto elaborado pela entidade internacional (Institute for Transportation and Development Policy) foi acompanhado e aprovado recentemente pela CET. No entanto, o órgão não informou se um novo prazo para a implantação ainda é estudado.


Caminhos alternativos

Para melhorar a vida dos paulistanos sobre as bicicletas, os grupos cicloativistas apresentam soluções. Uma delas é a ampliação da malha cicloviária de modo que vise a integração com transportes de massa, como terminais de ônibus, trens e metrô. “É essencial passarmos de iniciativas pontuais para um levantamento amplo da cidade, que tenha como foco os locais prioritários e não apenas de lazer, como parques”, afirma Gabriel Di Pierro. “As decisões e projetos devem ser abertos à participação da sociedade civil”, completa.

Opinião semelhante tem a ex-vereadora e ex-subprefeita da Lapa, a jornalista Soninha Francine. “Para os ciclistas circularem de modo seguro, precisamos traçar os melhores caminhos, criar conexões entre as rotas e escolher as estruturas mais adequadas, sejam elas ciclovias, ciclofaixas, ou vias compartilhadas. Um Plano Cicloviário tem de ser feito em cada bairro, senão acontece como na Avenida Sumaré, uma faixa central que não conecta nada a lugar nenhum”.Quanto à disputa de espaço entre bicicletas e carros nas ruas, Felipe Aragonez afirma que esse impasse pode ser resolvido. “Construir ciclovias e ciclofaixas em São Paulo é possível, temos 1,7 mil quilômetros de vias asfaltadas e em muitas delas, há condições de se implantar ciclovias, como é o caso das avenidas Faria Lima e Sumaré, além da Marginal Pinheiros”. O diretor do CicloBR ainda destaca as ciclofaixas como alternativa para algumas ruas e avenidas sem grandes canteiros centrais. “São mais fáceis, baratas e rápidas de serem viabilizadas e não segregam totalmente o espaço com os veículos motorizados. Se o poder público tirar vagas de carro das ruas é possível pintar ciclofaixas e aumentar as calçadas. Falta vontade política e coragem de enfrentar o lobby da indústria automobilística. O menor deve ter privilégios sobre o maior, sempre”.


Diego Gouvêa
Colaborou Tomás Fernandes e Felipe Ramos

                                                 


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